Merval Pereira, O Globo
Que o relacionamento do PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos,
com o PT não é essa maravilha toda, não há quem desconheça entre os que
lidam com a política. Mas a explicitação de um projeto político
autônomo que parece estar sendo desenhado desde já, na armação das
alianças eleitorais para a eleição municipal, não agradou aos dirigentes
socialistas.
O vice-presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, soltou ontem uma
enorme nota oficial para desmentir que seu partido esteja alimentando
voos mais altos, como vários comentaristas, inclusive eu, afirmam ser o
objetivo das últimas movimentações partidárias na formação de alianças
para as eleições municipais.
Mas, ao longo da nota, Amaral vai revelando alguns pontos da
discordância com o PT, partido a que o PSB está ligado desde a campanha
presidencial de 1989, quando Lula foi derrotado por Collor para a
Presidência da República.
Na verdade, o que está claro para os que acompanham a política é que o
PSB tenta se fortalecer nesta campanha municipal para fazer frente não
apenas ao PT, mas, sobretudo, ao PMDB, que hoje ocupa o papel hegemônico
na aliança governista.
O objetivo do PSB é, segundo diversos relatos, num primeiro momento,
ocupar a vaga de vice na chapa de reeleição de Dilma Rousseff, posto que
já teria sido garantido a Eduardo Campos pelo ex-presidente Lula.
Na sequência, Eduardo Campos pretenderia ser o candidato presidencial da
aliança governista em 2018, tirando do PT a prioridade para indicar o
candidato.
Caso se mostre inviável essa alteração, o PSB pensaria em voo solo já em
2014, já que a adesão ao projeto político do PSDB, que já esteve em
cogitação, estaria ficando mais difícil, mesmo sendo Campos muito
próximo do senador Aécio Neves, que deve ser o candidato tucano à
Presidência da República.
A dificuldade estaria não apenas no relacionamento político e pessoal
com o ex-presidente Lula como no crescimento do nome do governador de
Pernambuco como liderança política nos últimos tempos e no
fortalecimento do PSB como partido, ainda mais se unir com o PSD do
prefeito paulistano, Gilberto Kassab, firmando sua posição no Sudeste.
O vice Roberto Amaral lembra que o PSB sempre defendeu a política de
frente “(...) mesmo quando nosso principal aliado, o PT, praticava a
unilateralidade das candidaturas próprias como tese e projeto isolado de
crescimento, ao arrepio, na maioria das vezes, da realidade objetiva
que clamava pela união das forças de esquerda”.
Ele ressalta que o PSB tem sido sempre fiel “principalmente ao
presidente Lula” e assim permanecerá “enquanto seus projetos puderem ser
partilhados na igualdade do respeito mútuo e no respeito às eventuais
divergências de tática”.
E adverte: “Aliança entre iguais compreende, como argamassa,
independência que não rima com alinhamentos automáticos. Somos partidos
que se respeitam.”
Roberto Amaral diz em sua nota que, mesmo sendo “aliado leal”, o PSB
cultiva “seu próprio projeto, seus próprios objetivos e sua forma
peculiar e socialista de buscar o poder na companhia das forças de
esquerda fortalecidas pelo apoio das crescentes camadas progressistas e
democráticas de nossa população”.
O “simples fato” de o PSB ter candidaturas próprias em Recife e
Fortaleza, e o PT ter decidido lançar candidato próprio em Belo
Horizonte, não significa que os planos nacionais estejam prejudicados,
esclarece Amaral.
Mas continua sua crítica à impossibilidade de uma aliança, dizendo que
os dois partidos em Belo Horizonte estão “esquecidos do sucesso em que
se constituiu política e eleitoralmente a aliança que levou Marcio
Lacerda (do PSB) à prefeitura em 2008”.
Amaral atribui a uma análise “frívola” a dedução de que os desencontros
municipais indicam mudanças mais profundas na relação nacional entre os
dois partidos, atribuindo às alianças municipais “a lógica da vida
local, ou seja, muitas vezes em distonia com o quadro nacional”.
Para ele, a explicação é vária. Mas todas elas são apontadas em tom
crítico, e, como o documento não é uma autocrítica, pode-se deduzir que
as críticas são dirigidas ao PT:
“Pode ser a pobreza de nossas estruturas partidárias, pode ser a
mediocridade do debate ideológico, pode ser a despolitização da
política, pode ser, até, o pragmatismo que, como cupim insaciável,
devora as entranhas de nossos partidos. Pode mesmo ser a
espetacularização da política, a preeminência da campanha televisiva e,
por força dela, a busca de alianças partidárias sem viés ideológico, mas
simplesmente para compor tempo viável no programa eleitoral.”
A exceção, ressalva a nota, é a eleição na cidade de São Paulo,
explicando assim a intervenção da direção nacional para que a regional
do PSB, que queria apoiar Serra, ficasse com o candidato petista,
Fernando Haddad.
“Nossa vitória, ali, é estratégica porque ali se trava a verdadeira luta
contra o atraso e as elites perversas. Ali, fossem quais fossem os
prejuízos, não poderíamos concorrer para que o interesse paroquial
sobrelevasse os compromissos com a política.”
Um bom exemplo da visão crítica que o PSB tem da atuação do PT está na
explicação de Roberto Amaral sobre o que aconteceu na formação da
aliança em Recife, por tudo fundamental para o governador Eduardo
Campos:
“No Recife, a candidatura própria nos foi imposta pela lamentável crise
do PT, que, ao fim e ao cabo, chega ao pleito ainda dramaticamente
dividido e, por essa razão, podendo ameaçar a esquerda pernambucana com a
derrota eleitoral, ou seja, dito pela mão inversa, nos acenando com o
retorno ao poder daquelas mesmas forças que, juntos, PSB e PT lograram
derrotar, para fortalecer a sustentação do governo da presidente Dilma,
governo que nos honra e nos enche de contentamento e orgulho.”
O documento do PSB termina com uma afirmação que é também uma
advertência ao PT: “Nosso compromisso com a continuidade do projeto de
centro-esquerda, ora liderado pela presidente Dilma, não entra em
contradição com nosso desejo, legítimo e necessário, de crescimento”.
http://jc3.uol.com.br/blogs/blogjamildo/
Nenhum comentário:
Postar um comentário