quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Obrigatoriedade de cotas nas universidades divide opiniões

Aprovado ontem no Senado, o projeto de lei que determina a reserva de pelo menos 50% das vagas em universidades federais para estudantes que cursaram o ensino médio na rede pública divide opiniões. Para associações, a medida fere a autonomia das instituições federais sobre seus processos seletivos. Entre especialistas, há quem acredite que as cotas são uma ferramenta importante de inclusão social e quem veja problemas na sua adoção pelas universidades.

O presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Carlos Maneschy, diz que a Andifes acredita nos benefícios das ações afirmativas, tanto que várias universidades filiadas já as adotaram, mas questiona a imposição de um mesmo modelo para todas as instituições.

"Na minha própria universidade já adotamos cotas desde 2008. Nós ouvimos a comunidade interna, a sociedade e criamos o nosso modelo, que é até bem parecido com o proposto pelo projeto. No entanto, acreditamos que estes programas devem seguir o princípio da autonomia universitária. Do jeito que está, confronta a autonomia. Cada universidade deve tomar as suas decisões de acordo com as suas especificidades", critica Maneschy.

A presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, concorda com a avaliação da Andifes. Na sua opinião, muitas instituições já possuem processos em andamento e isso não foi observado pelo Congresso Nacional.

"A SBPC é a favor das políticas de ações afirmativas. Nosso questionamento é que o projeto não levou em consideração a autonomia universitária que é garantida pela própria Constituição. Muitas universidades federais e estaduais já têm programas de cota em andamento, mas isso não foi olhado. Em nome de um projeto que é justo, o governo está generalizando tudo que já estava acontecendo. Cada instituição encontrou o modelo ideal para si", afirma Helena.

Para o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Marcelo Paixão, as cotas são necessárias para facilitar o acesso das classes menos favorecidas ao ensino superior públicas.

"A aprovação de uma lei desse tipo é uma demanda de muito tempo. Podemos fazer uma analogia desse projeto com as leis que determinam uma tratamento diferenciado a deficientes, idosos e gestantes. Ninguém questiona a necessidade de instalação de rampas para facilitar o acesso de idosos e deficientes. A lei das cotas nada mais é que uma rampa para facilitar o acesso das classes menos favorecidas. É mais uma oportunidade para os mais pobres terem acesso ao ensino superior. Se deixasse por conta das universidades, isso nunca ia acontecer", diz Paixão, que coordena o Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (Laeser/UFRJ).

O economista Simon Schwartzmann, do Instituto de Estudos Trabalho e Sociedade (Iets), aponta consequências sérias que precisam ser levadas em conta com a aprovação da medida. Ele argumenta que a entrada dos pobres na universidade é uma opção legítima, mas vê problemas na manutenção da excelência acadêmica.

"É legítimo que se decida que as universidades federais devem atender os pobres, agora precisa entender como fazer isso direito. Até hoje, sempre tiveram um perfil de elite. É muito difícil manter o padrão acadêmico recebendo metade dos alunos com má formação. Vai precisar mudar o currículo, a formação, resolver o que fazer com a pesquisa de alto nível. A universidade vai precisar lidar com dois públicos muito distintos: um ainda mais qualificado, pois a seleção será mais dura, e outro com uma formação deficiente. Ou diminui a exigência acadêmica ou a evasão será altíssima. Adotar essa política sem levar em conta isso pode ter consequências desastrosas", opina Schwartzmann.

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